Alho-semente livre de vírus aumenta produtividade em até 150%
Desenvolvido por instituições brasileiras de pesquisa, o alho-semente livre de vírus mudou a produção da hortaliça no Brasil. A adoção da tecnologia levou a um incremento da cultura no País de até 150% para algumas cultivares.
Hoje, grandes produtores da região do Cerrado conseguem produzir até 25 toneladas por hectare (ha), bem distante das 8 toneladas produzidas no fim dos anos 1990. Na safra de 2021/22, a produção brasileira de alho foi de 220 mil toneladas, em uma área plantada de 16 mil hectares, e com rendimento médio de 13.750 kg/ha.
O caminho até o desenvolvimento da tecnologia foi longo. O programa de pesquisa da Embrapa em alho-semente livre de vírus já tem mais de 30 anos. De acordo com o pesquisador Francisco Vilela Resende, da Embrapa Hortaliças (DF), nos primeiros dez anos, a Empresa adotou a estratégia de concentrar o esforço em aprimorar o protocolo de limpeza, identificar as viroses, desenvolver os protocolos de indexação e avaliar como as plantas livres de vírus se comportariam no campo de produção comercial, estudando principalmente as curvas de reinfecção viral para estabelecer por quanto tempo seria possível usar o alho-semente sem perder a qualidade fitossanitária e fisiológica.
“A segunda parte se concentrou em levar a tecnologia para o agricultor e garantir a manutenção desse alho nas regiões produtoras, reduzindo a dependência da instituição geradora do material livre de vírus”, explica o pesquisador.
Tecnologia eficaz e acessível
A produção de alho-semente livre de vírus é uma tecnologia bastante acessível, adotada tanto por grandes quanto por pequenos produtores. A estimativa é que, pelo menos, 30% do aumento de produtividade na cadeia de produção de alho no Brasil seja devido à adoção dessa tecnologia pelos agricultores.
No caso dos pequenos produtores o impacto da tecnologia é ainda maior, pois historicamente eles sempre utilizaram alho-semente de baixa qualidade, de variedades bastante degeneradas e infectadas. Por isso, é comum observar a produtividade desses produtores dobrar com a adoção do alho-semente livre de vírus.
“Nas primeiras regiões em que nós começamos a trabalhar, os produtores conseguiam apenas 4 ou 6 toneladas por hectare. Com apenas dois anos de adoção do alho-semente livre de vírus, a produtividade passou para 10 a 12 toneladas por hectare. Isso sem inovar nenhum outro componente no sistema de produção”, relata o pesquisador.
É o caso de José Borges de Brito, conhecido como Valdez, produtor de alho-semente livre de vírus na região de Cristópolis (BA). Ele destaca que a tecnologia foi muito bem aceita na região por conta dos bons resultados e do aumento da rentabilidade das famílias. “Hoje eu tenho a minha renda e mantenho minha família tranquilo, sem precisar ir buscar um emprego lá fora. Essa é uma tecnologia que mantém a gente na roça”, assinala.
“Antes, a minha produtividade era de 3 a 3,5 toneladas por hectare usando o alho infectado sem nenhuma tecnologia, nenhum acompanhamento. Hoje, trabalhando com o alho-semente livre de vírus, estou produzindo de 15 a 16 toneladas por hectare. Foi um avanço muito grande”, comemora.
O cultivo de alho
Por conta de sua capacidade de melhorar o armazenamento e a conservação de outros alimentos – e do seu poder medicinal no tratamento de várias doenças –, o alho fazia parte do cardápio da tripulação das caravelas portuguesas. E assim ele desembarcou no Brasil já na época da chegada dos europeus, e nos dias de hoje está presente em praticamente todas as cozinhas do País.
Em solo brasileiro, ficou por mais de quatro séculos restrito ao plantio de fundo de quintal, cultivado em pequena quantidade para suprir a demanda familiar. Somente em meados do século XX o cultivo começou a expandir-se comercialmente, ganhando importância econômica no País.
Tecnologia já é de domínio público
A tecnologia de produção do alho-semente livre de vírus é de domínio público há alguns anos. Existem empresas privadas, grupos de agricultores e grandes agricultores que já contam com toda estrutura de produção, desde laboratórios à aclimatação, casas de vegetação, telados e campos de produção.
A base dessa tecnologia foi gerada não só pela Embrapa, mas também por universidades e outras instituições de pesquisa. A tecnologia também é usada em outros países, mas com protocolos ligeiramente diferenciados de acordo com a realidade de cada local e com o tipo de alho e cultivares utilizadas.
Em busca da autossuficiência
O consumo nacional do alho é de, aproximadamente, 350 mil toneladas, sendo 40% importados e 60% produzidos em território nacional. Em 2019, o País consumiu 296.912 toneladas (1% do total mundial), sendo aproximadamente 165 mil toneladas produzidas nacionalmente e o restante (131.912 toneladas) adquirido principalmente de China, Argentina, Espanha e Egito.
As regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste são as principais produtoras no País. Nessas regiões destacam-se os estados de Minas Gerais, que responde por 50% da produção nacional, enquanto Goiás, Distrito Federal e Bahia são responsáveis por 30% dessa produção. Na Região Sul, destacam-se Rio Grande do Sul e Santa Catarina, com 20% da produção brasileira.
Mas ainda existe potencial de crescimento da demanda por produtos processados e diferenciados a partir do alho, tais como alho negro (defumado), chips de alho para saladas, pastas e cremes, entre outros.
Em busca da autossuficiência na produção de alho, alguns desafios ainda devem ser enfrentados pela ciência brasileira, como a mecanização do plantio e da colheita; pesquisa com ênfase no manejo fitossanitário; desenvolvimento e recomendação de novas cultivares; pesquisa em manejo de solos; e ajustes na tecnologia de vernalização de sementes visando ao aumento de produtividade, expansão das áreas de produção para outras regiões do Brasil e melhora da resposta da cultura às condições climáticas adversas.
Fonte: Eduardo Pinho/Embrapa Hortaliças
Foto Capa: Wenderson Araújo/CNA
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